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Capítulo 2: O viveiro de sementes e de ideias

O viveiro de plantas onde se fazem as sementeiras, segundo Aurélio, se chama de SEMINÁRIO! Diz-se também da “ocasião de semear idéias ou de favorecer sua germinação”. Em nossos Seminários no Terrapia semeamos e germinamos idéias! Juntamos conhecimentos, redescobrimos a natureza dos alimentos e com isso nos aproximamos da nossa. Diz ele também, que a “Semente, estrutura que conduz o embrião é no sentido figurativo, o germe, causa, origem, sêmen”. Ou seja, ela reúne a força do vegetal e o simbólico naquele ser vivo que aguarda o momento de vir a ser. É possivel que esteja contido nessa comparação aquilo que experimentamos na convivência com as sementes germinadas!
A alegria que nos invade, o encantamento, a nova estética e ética que surge, parece até que germinamos junto! Definitivamente a contemplação da natureza fica diferente! Talvez a sua força facilite o contato como original, o particular e o criativo de cada um de nós! Muitos adeptos relatam a facilidade com que entram em meditação ao consumir alimentos vivos. É conhecido que os pássaros exibem várias mudanças de acordo com o consumo de sementes: a colza faz cantar mais forte, o alpiste muda a cor da plumagem e algumas sementes alteram mesmo a fertilidade. Eles e nós podemos observar mudanças, novos horizontes e esperança!
O Terrapia, como muitos declaram, recupera a esperança! Finalmente para isso servem os “Seminários” de Promoção da Saúde!
 
 
O SEMINÁRIO SEGUNDO OS BOTÂNICOS
Há mais de 200 milhões de anos, ainda quando os dinossauros gigantes andavam pela Terra, surgiram as plantas produtoras de sementes. Desde aquela época que as outras formas de  reprodução dos vegetais foram cedendo lugar mais e mais para as sementes, com estruturas mais complexas chamadas pelos botânicos de Gymnospermas e Angiospermas (“Sperma”=semente Gymno=nu e Angio=urna). Ou seja, podem nascer “nuas” ou dentro de urnas ou invólucros. Este modo de se reproduzir deu certo e hoje as sementes ocupam a maior parte do globo terrestre! 
Assim, para os botânicos, um fruto com semente é um ovário que contém o óvulo fecundado! O óvulo fecundado ou semente se mantém a espera da oportunidade para se desenvolver. Podem esperar apenas alguns dias até encontrar as condições ideais enquanto outras podem esperar anos! As sementes então carregam este “embrião, germe ou pólo germinativo”, com um projeto de raiz (radícula) e de caule, revestido de proteção (que contém um inseticida natural) e reservas de alimento que vão alimentar a planta nova até que ela possa buscar por conta própria. É uma planta em seu limite mínimo de manutenção da vida, pronta para beber a água e desenvolver suas potencialidades. Para ela, germinar significa inverter da dormência para o despertar! Um processo que sai do consumo mínimo de energia para a explosão máxima. Mas, enquanto aguarda, utiliza sua força para esperar, mantendo-se no metabolismo mínimo, basal.
Mas como são formadas as novas sementes? Nas plantas que produzem sementes, os órgãos reprodutores femininos são desenhados pela natureza para receber os “micrósporos”, órgão masculino da planta. Os órgãos femininos são compostos de um ou mais óvulos que estão inseridos no ovário, envolvidos pela placenta, que se chama “gineceu”. O órgão masculino, formado pelo conjunto de “estames” onde se localizam os micrósporos se chama de “androceu”. Após a fecundação através da polinização pelo vento, insetos, animais em geral, a flor murcha e permanece o ovário que cresce transformando-se em fruto. Os óvulos agora fecundados são o resultado do encontro das duas células masculino e feminino que irão se transformar em novas sementes.
 
O SEMINÁRIO SEGUNDO GOETHE
 “A planta arquetípica “
Segundo Goethe a planta em estado de semente, através da luz, calor e água, quando colocada na terra, germina e cresce provocando movimentos de contração e expansão. Surge então o elemento rítmico do crescimento, próprio dos seres vivos. Ocorre então uma metamorfose, ou seja, uma transformação de um elemento para outro em outro plano.
A primeira manifestação de expansão são as folhas; de contração são os nós do caule de onde saem as folhas; nova contração surge o cálice floral; nova expansão surge o fruto e finalmente nova contração onde surge a semente, fechando-se o ciclo. Segundo ele, ainda há na planta duas polaridades: uma em direção ao solo, onde as substancias se condensam e se mineralizam e outra em direção às flores e frutos, onde as substancias os torna mais leves, chegando a formação de óleos voláteis e perfumes. Além do odor e sabor, no pólo superior da planta se formam as cores tanto das flores quanto dos frutos. Depois de polinizadas algumas plantas desaparecem deixando a semente no solo para gerar outra planta.
Novamente se materializa e desmaterializa, no movimento de expansão e retração, repetidamente acolhendo as metamorfoses.
Goethe, pensador, poeta e botânico consegue juntar nesta obra toda sua criatividade e hoje ainda é conhecido pela grande contribuição que deu aos botânicos.
 
O SEMINÁRIO SEGUNDO OS PLANTADORES 
Qual seria a noção de seminário entre os plantadores?  Como  chegaram  tantas sementes em nossa mesa e com tamanha quantidade? Quem plantou, como e onde? Qual o custo disso para nós, o planeta e a vida social? E hoje, que importância tem a semente para os plantadores?
No contato estreito com os plantadores ecológicos o  conhecimento intuitivo, a sensibilidade da observação ainda está presente e as sementes ocupam lugar de destaque! Para os plantadores convencionais hoje em dia, arrisco a afirmar que  se trata do espaço onde se fazem sementeiras em série para venda ou replantio.
A história dos agricultores começa há 10000 anos quando cuidavam de certas espécies de plantas que nasciam naturalmente!
Modificavam seu habitat ou facilitavam sua reprodução a partir da observação do crescimento. Nesse tempo,  a semente era considerada um patrimônio natural e cultural da grande importância para os plantadores. Desenvolveram  habilidades na “domesticação” das plantas e também na forma de dominação da natureza. E, as sementes com “rendimentos” maiores  e de crescimento previsível foram sendo selecionadas.Em um determinado momento histórico, o ambiente natural foi perdendo importância para os plantadores. O conhecimento inicial baseado na intuição sobre o manejo das plantas foi gradativamente  substituído pela tecnologia. Dirigido por poucos homens, o poder do conhecimento  sobre a genética das sementes adquiriu  valor de “bem econômico” e, como conseqüência, tornou-se objeto de especulação financeira. A semente virou negócio!Um marco histórico foi o da Revolução Verde  nos anos 50 e 60 surgido após a segunda guerra mundial . Deixou como herança uma grande produção de insumos agrícolas. Esses produtos, provenientes da sobra das armas químicas desenvolvidas, foram então usados como herbicidas, pesticidas  e outros aplicados a agricultura. Não existe na história humana paralelo a este momento em que se espalhou produtos químicos no solo em todo o planeta, através de um “plano para reduzir a fome mundial”.
Nos dias atuais as sementes interessantes são aquelas que desenvolvem plantas com alto rendimento, aparência atraente, uniformidade genética, resposta rápida a irrigação e ao uso de fertilizantes. Aquelas com  facilidade de colheita, processamento e vida mais longa nas lojas de venda. Criou-se o termo “Cultivar”, para designar aquelas sementes trabalhadas geneticamente. Os agrônomos convencionais se referem as sementes como um pacote fechado: “As sementes são produzidas por produtores e empresas especializadas. A semente é um pacote cujo conteúdo são todos os genes que caracterizam a espécie e a cultivar. Se uma determinada cultivar é eleita pela pesquisa e pelo consenso entre produtores, é porque o seu comportamento é o melhor possível para as condições de clima, solo e de tecnologia agrícola da região, e as características de seus produtos, são as mais aceitas.
Conseqüentemente, o patrimônio genético desta cultivar, que basicamente diferencia seu comportamento, tem que ser protegido”. “As cultivares devem apresentar boas respostas a aplicação de insumos modernos, incluindo fertilizantes químicos, inseticidas, herbicidas, fungicidas, reguladores de crescimento e desfolhantes  É exigida boa adaptação a colheita mecanizada, devendo as plantas apresentarem a inserção do primeiro ramo frutífero acima de 20 cm do solo; porte ereto, mesmo quando fixarem todo seu potencial produtivo; capulhos bem aderidos as cápsulas e que não caiam mesmo após fortes chuvas e ventos. Devem ser tolerantes aos veranicos prolongados, que ocorrem normalmente nos cerrados de Goiás, Bahia, Maranhão e Piauí; devendo apresentar sistema radicular vigoroso e profundo; possuírem alta capacidade de fixação de capulhos nas plantas, inclusive até nos ponteiros; e suportarem espaçamentos estreitos e altas densidades de plantas/metro linear de sulco” (Carvalho & Nakagawa, 1980).
E eu ainda insisto que as sementes foram criadas pela natureza!
 
Esse processo alterou a capacidade das sementes de resistir às tensões do ambiente natural como frio, calor, ventos, assim como lidar com a visita dos insetos, modificando seu “sistema imunológico”. Com isso, as sementes cultivadas exigem mais e mais os insumos agrícolas para garantirem o seu desenvolvimento. Como a maior parte das sementes modernas em geral é híbrida, também a planta não possui mais capacidade de reprodução e, portanto não podem ser replantadas, exigindo que os plantadores comprem novas sementes a cada plantio. Desta maneira se estabeleceu a dependência econômica da produção agrícola convencional. Fato interessante ao modo de viver baseado no capital. Muitas sementes perderam status na alimentação humana por conta dos critérios acima. Hoje há uma clara tendência para uma uniformização do cultivo, gerando uma alimentação “global”.
Vejam só: são mais de 4 mil espécies de plantas comestíveis catalogadas pelos botânicos. Em torno de 600 são cultivadas consideradas rentáveis. Nas cidades talvez se conheçam umas 300 que chegam aos pontos e venda. E pensar que ainda fazemos a seleção das que agradam ou não ao paladar. Resultado: empobrecimento de informação!Com isso se deixa de lado a originalidade das plantas e a seleção natural  utilizada pela natureza. A harmonia de sua constituição própria para se comunicar na trama viva. Desconsidera-se o corpo vital da planta, dinamizada pelo balanço dos ventos, energizada pelo sol, raios cósmicos das estrelas, da lua, pranificada pelas chuvas e ventos!... Aquelas que passam pelo “ controle de qualidade” da Natureza!!!
A resistência dos plantadores biológicos:
Como um movimento de sensibilidade ou resistência, muitos plantadores insistem em manter ou retornar ao caminho original e recuperar a informação das sementes comestíveis, chamadas de pé duro ou crioulas. Eles estão espalhados por todo lado! A semente para esses plantadores  é um patrimônio da natureza e carrega toda a informação da origem do planeta e sua história. A relação com a natureza é de cooperação, no lugar de dominação para as práticas de cultivo. Quanto menos interferência no solo melhor, dizem eles, pois partem do princípio que solo sadio, produz planta sadia e homem sadio. O solo é entendido como um organismo vivo, berço das sementes vivas. E o planeta um grande ser vivo que pulsa formada por todos os seres vivos como uma grande orquestra. Podemos encontrá-los nas feiras agroecológicas . Mas como são poucos ainda, precisamos fortalecer esse processo através de visita e valorização de seus produtos. 
A esses plantadores em ecossistemas naturais em franco crescimento, a nossa homenagem!
 
O SEMINÁRIO SEGUNDO OS CONSUMIDORES DO TERRAPIA
A tomada de decisão é decisiva na hora cuidar do corpo e da alimentação, assumindo a frente desse processo! Inverter o caminho até aqui percorrido, onde o outro cuida de nossa comida (e muitas outras coisas mais) para assumir cada vez mais a responsabilidade com a saúde, se torna um objetivo quando queremos desenvolver uma vida de paz,“cuidado e ternura”, como nos lembra Leonardo Boff.
Colocar para dentro de nós (comida) a forma de vida que queremos (seja viva, empacotada, modificada geneticamente, original ou criativa) vai determinar o famoso “Você é que você come”, tão antigo quanto a nossa própria história!
No Terrapia, conhecer as sementes e suas histórias tem sido parte desse processo como forma de conhecimento das vidas que se oferecem a continuação de nossa própria vida.
As sementes, para os consumidores da alimentação viva, passam a ser um marco de referência mesmo porque aprendemos com elas muitas coisas: a delicadeza dos brotos, a diversidade de comportamentos e a individualidade nos ritmos de crescimento. A diferença de cada uma mesmo dentro de um mesmo lote de produção. A importância do terreno, o tempo que esperam para germinar e a espera após a colheita. A qualidade da semente, sua vitalidade e procedência. A convivência com os carunchos, traças, passarinhos e outros animais. A importância da qualidade da água em seu crescimento. E, finalmente contribuem para nos identificar com elas: umas são muito rápidas e outras lentas, assim como nós! 
O “brotário doméstico” é o nosso “viveiro de sementes e de idéias”!
O encantamento com a vida que chega e os diversos sabores gerados amplia nosso universo alimentar, especialmente quando são acompanhados de profundo bem estar! Sobra energia para um dia inteiro de movimento além da alegria que proporciona! 
 
A experiência poéticas de Dolores Montesó nos mostra isso:
 
"Me curvo aos teus cuidados
Delicada e mil vezes forte.
Cheia de histórias...
Quando te molhas, crias vida
E fica sensível a essa magia.
Dás-me chance de ver a transformação da vida no meu dia a dia,
Como criança que cresce.
E juntas dependemos uma da outra.
Gracias sementes!"

 

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